ENÉAS LOUR É ATOR, DRAMATURGO, CENÓGRAFO E DIRETOR TEATRAL

5 de dez. de 2010

A GRALHA AZUL / ENÉAS E FÁTIMA


A GRALHA AZUL EM CRISE
  

Na matéria do Caderno G deste domingo (05/12/2010), a premiação do Troféu Gralha Azul é criticada por alguns artistas locais em alguns aspectos e mecanismos, tais como a seleção de jurados pouco afetos ao metier, quando, na realidade, me parece que o foco principal das críticas deveria ser endereçada ao seus mantenedores, ou seja, aos órgãos oficiais de Cultura no Estado do Paraná, especificamente à Secretaria de Cultura via Centro Cultural Teatro Guaíra, que mantém tal premiação oficial. Estes sim, como órgãos de fomento às artes cênicas, deveriam ser questionados pela classe artística pela desvalorização desta premiação, que, ano a ano vem se configurando como uma falácia, em termos de política cultural cujo objetivo seria prestigiar o artista e a produção teatral paranaense.

Porém, é somente nos finais de temporada, depois de publicados os indicados à premiação, que surgem – todos os anos – as críticas, geralmente superficiais, sobre estes ou aqueles aspectos; esta ou aquela indicação; este ou aquele disparate, engano ou falha creditada aos jurados, etc... etc...
Mas, durante o decorrer do ano nada ou quase nada é feito, nada é proposto para reestruturar, redimensionar, rever tais questões. No máximo uma ou outra reunião, ditas assembléias, no SATED, com pouquíssima freqüência são realizadas e, no próximo ano, lá vem de novo no jornal a mesma história de anos e anos.

O que tem que haver é a disposição da classe em exigir que as entidades oficiais de cultura, que o novo Secretário de Cultura, o novo Diretor Presidente do CCTG efetivamente se comprometam e assumam a discussão profunda com a classe artística para implementação de um projeto de premiação que resulte na valorização do artista local.

Um projeto de premiação cujos critérios objetivem abrir espaço para a produção cênica local. Não essa migalha de final de ano que confere um troféu de latão e uma quantia irrisória de dinheiro aos premiados, inclusive com desconto de ISS, coisa bem estúpida para uma premiação estatal.

Alguém se lembra - alguém da classe artística local, porque seria demais pedir que algum “leigo” se lembrasse - de quem ganhou o Troféu Gralha Azul do ano passado? E dos premiados de 2009, alguém, além dos então premiados, se lembra quem recebeu a Gralha Azul como o “melhor” daquele ano de 2009? E de 2008? ... Não? ... Pois é: ninguém lembra porque esta premiação não repercute, não adiciona nada, não destaca ninguém, não valoriza ninguém, nem o artista, nem o grupo, nem os técnicos, nem as companhias, nada.

Isto tem que mudar.
Um projeto oficial de premiação do Estado do Paraná deve ser significativo. Deve ser maior que um troféu de lata. A Secretaria de Estado da Cultura deve buscar o diálogo com a classe e vice-versa para projetar um futuro mais decente da premiação do talento do artista paranaense.

É louvável a proposta de Giovana Soar, Beto Bruel, Chico Nogueira, Maurício Vogue e outros interessados, em articular encontros para discutir uma proposta de reestruturação do Prêmio Gralha Azul.

É hora de todos nós, que atuamos no teatro local, batermos o pé e formularmos nossas propostas, ambiciosas, sim, para que exista esta premiação, ou para que seja extinta de uma vez.

Enéas Lour
Autor, ator, cenógrafo e diretor teatral

________________________________________________

Gralha Azul e os levados no bico
Por  Fátima Ortiz


Prêmios sempre serão discutíveis e limitados.
A vulnerabilidade está na essência do fato de apontar quem é o "melhor em arte. Deveria ser proibido. "
Mas nos gostamos de no mínimo sermos indicados.

Nossa Gralha Azul caducou há pelo menos 10 anos. Está acamada, entubada e não morre. Respira um ar provinciano. Ela é forte justamente por ser estéril. Não pariu. Não tem herdeiros. E suas asas fechadas hoje evocam saudosismo.

Curitiba mudou muito. O movimento teatral pede outras formas de mostrar os destaques da cena teatral.

Não adianta querer repensar o troféu tendo nas mãos os regulamentos anteriores.
O premio foi criado num momento muito impactante da classe artística, regulamentação da profissão, novos grupos independentes e efervescência cultural na cidade.
Hoje vivemos outro tempo, outros impactos, outras efervescências. Uma riqueza e uma diversidade fenomenal e muitos talentos em todas as categorias do fazer teatral despontam a toda hora.

Nosso teatro é reconhecido fora dos muros da província. Mas a gralha não consegue abrir as asas. Seu vôo rasteiro é comandado pelo estado com sua postura miserável, aquela que nos engana com migalhas do tipo “com eles nossa obrigação está cumprida”.

A mudança deve ser radical e pensada pelos jovens artistas maduros que a cidade está repleta.

Temos que ter coragem de dizer não e de deixar o velho morrer, de desentubar o moribundo!

Pra que é que serve ganhar este premio hoje? Um prêmio engessado na estrutura de um estado que nunca foi tão omisso. Um prêmio que deveria ser fruto de política cultural, palavra desconhecida dos nossos governantes.

Nossa cidade merece prêmios todos os dias, todos os meses, e em todas as estações!

O melhor prêmio que o estado pode nos dar é um reconhecimento que parta do olhar pela diversidade.

Se o estado conseguir abarcar nossos talentos e nossas produções abrindo muito mais espaços de trabalho, arejando os corredores ociosos, ventilando as salas de reunião, liberando verbas significativas, não precisará oficializar numa estátua e numa festa mixuruca a sua atenção pelos artistas de teatro.

Se ele fizer sua parte gerando movimento cultural e visibilidade da produção criativa, pode ser que outras instituições venham a criar outros prêmios.

Se o estado nos acolher no dia a dia com menos burocracia “a gralha botará ovinhos e os filhotes aprenderam a plantar o pinhão sem chão demarcado”.

Prêmios sempre serão discutíveis e limitados se forem assim burocráticos e circunstancias.

Quem vai dirigir a festa-cerimonia este ano?
Quanto de grana os premiados vão ganhar?
Vai ter desconto de imposto?
E depois nos meses seguintes quem vai continuar nos bajulando?

Não precisamos de falsos paternalismos.
Se for para premiar com grana que ela seja bem gorda!

Primeira questão que eu botaria na roda:
- Quanto o estado vai investir neste prêmio?
E depois como?
Caixinha de natal é humilhante.

Segunda questão ou pedido:
- Que nenhum amigo ou inimigo desta classe artística aceite ser membro da comissão julgadora para 2011.
Se não tivermos comissão o tubo está desligado.

Neste caso uma interrupção do prêmio seria saudável.
Dar tempo para surgirem outras idéias, mais condizentes com as novas realidades.

Não se decidem mudanças. Elas acontecem se forem favorecidas.
E se houver reflexões maduras poderá renascer das cinzas uma gralha-fênix com vôos mais arrojados.
 
A minha casa talvez seja o maior reduto deste peso cultural chamado Troféu Gralha Azul.
Não posso negar sua utilidade pratica de separar os livros nas estantes.
Mas, eu não quero ficar velha, chata e saudosista lustrando plaquetas. Minhas Gralhas requereram a eutanásia
e eu comecei hoje mesmo a desparafusar as asas de todas elas.

Fátima Ortiz
Atriz, autora e diretora de teatro.

3 comentários:

Fernando disse...

Corcordo plenamente com os dois textos anteriores e acrescento algo que deva ser levado muito em consideração: Por mais que existam os problemas que precisam reestruturação, também existe o olhar dos próprios indicados que precisa de colírio.

Muitos indicados desmerecem a própria indição e deixam mesmo de ir a premiação... Preferem tomar uma "bera" no café do "teatro".

Pensar e discutir políticas culturais durante o ano todo, inclusive no dia da premição... Como? Indo na premiação já é um começo... nem que seja pra ver que está horrível e pensar: "O que eu estou fazendo pra modificar algo?".

Dá pra deixar a bera pro dia seguinte (se conseguir descontar o cheque e se sobrar alguns trocados).

Unknown disse...

Quando comecei a fazer teatro me encantava com o troféu Gralha Azul.
Era uma grande festa, técnicos e artístas verdadeiramente merecedores eram premiados, o baile, após a premiação, acontecia de maneira elegante, e eu parabenizava os ganhadores com orgulho da produção cultural paranaense.
Passados 20 anos as coisas mudaram tanto que em 2008 quando ganhei o troféu de melhor espetáculo infantil à sensação que tive era que havia feito uma coisa muito errada. Parecia que as pessoas estavam com ódio, eu sonhei tanto com aquele momento e ele não tinha mais o romantismo e o glamour que eu esperava.

Em 2010 concorri novamente ao prêmio - acho que nunca vou dizer que não quero mais participar do mesmo - mas, fiquei muito triste ao ver na platéia um dos jurados sonolento. A princípio pensei “Acho que o meu espetáculo esta horrível” aí questionei o respeito pelos artistas e técnicos envolvidos na minha produção, e por fim, a existência do troféu, uma vez que falta o básico, o respeito.
Acredito que a comissão não pode e não deve ser curitibana, pior ainda se alguém da comissão assiste, julga, apresenta e entrega o prêmio ao longo dos anos. Porém acredito que tudo vai melhorar, e que os piores oito anos já passaram!

Abraços,
Márcio Roberto.

Anônimo disse...

Il semble que vous soyez un expert dans ce domaine, vos remarques sont tres interessantes, merci.

- Daniel